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Pavio Curto
Pavio Curto
Asséde Paiva
“Seu” João, no tempo que era homem sério ou passava a imagem de Chefe de família, foi convidado para apadrinhar meu tio Antônio Carlos de Almeida que ia se casar com a minha futura tia Dorinha (Maria das Dores). Nós morávamos em Chapéu D’Uvas. O casamento seria realizado em Valadares. Fomos toda família: Eu, o caçula, V*** e minha mãe, Didi. “Seu” João é o principal personagem desta história ridícula, até certo ponto. Todavia, quero relatar um fato, abrir um parêntesis sobre tema correlato ao pavio curto de “seu” João:
Certa feita, “seu” João e seu companheiro Anísio, viajaram para o local chamado Valadares, povoado da Estrada de Ferro JF–Lima Duarte, onde nasci, para jogarem futebol. Eles eram do time do Aymoré Futebol Clube, de Chapéu D’Uvas. Durante a partida, houve desentendimento entre Anísio e um adversário denominado Clodoveu, da equipe de Valadares e, o pau quebrou. A equipe do Aymoré estava em desvantagem porque os assistentes/expectadores entraram na briga a favor dos valadarenses e, era cacetada, soco e pedrada para valer. Anísio tomou um soco no olho direito, outro na boca e caiu desmaiado. “Seu” João, sentindo-se encurralado por três adversários, pulou um córrego, de costas e tomou uma pedrada na fronte e o sangue desceu. Ele, todavia, abaixou-se e puxou o revólver, então no bolso da calça, deu vários tiros para cima. Correria geral e, a briga acabou ali mesmo pela dispersão dos briguentos. Os chapeuduvenses subiram na carroceria do caminhão que lhes trouxe e voltaram com suas escoriações para casa. Tempos depois, assisti “seu” João e Anísio rememorarem o acontecido e dando boas risadas. Fim do parêntesis.
Na época desse evento, “Seu” João Minga andava muito nervoso porque perdera dinheiro ao comprar uma boiada, com seu amigo Anísio. Eles foram às compras nos confins, onde Judas perdeu as botas. Na viagem, desgarraram muitas reses e, as remanescentes emagreceram demais. Quando chegaram com a boiada ao destino (nossa casa), por maus fados era tempo de seca, faltava pasto para alimentar as reses. Tiveram que vender a boiada a preço vil, para José Vieira, o pai de Anísio, que tinha pasto suficiente para esperar que o gado engordasse, então, vendê-lo para abate no Rio de Janeiro.
Pois bem, voltando ao tema principal, para irmos a Valadares tínhamos que pegar um trem misto pela manhã, pernoitar em Benfica e pegar o MJ (prefixo do trem) e seguir para o citado ramal de Lima Duarte, até Valadares, onde se daria o casório. Naquela noite dormimos na casa de João Soldado, em Benfica. Embarcamos no MJ, entretanto, “seu” João decidiu não comprar passagem para o filho caçula, que era miúdo e aparentava menos idade do que realmente tinha. Mal saímos de Benfica, veio o chefe do trem pegando e picotando as passagens dos passageiros. Quando chegou perto de nós, “seu” João, que não dava ponto sem nó, espertamente, deu uma de João sem braço, pôs o menino no colo e deu ao Chefe do trem os bilhetes dos demais familiares. O Chefe exigiu a passagem do menino por achar que ele passara da idade para viajar de graça. “Seu” João mentiu dizendo que o garoto, só tinha cinco anos. Na verdade, tinha sete. Foi um bafafá. O trem ficou parado na estação de Igrejinha, horas a fio. O Chefe do trem telegrafou para Juiz de Fora pedindo reforço policial, que, afinal, não veio. “Seu” João, nervoso, e aos gritos, tirou da carteira uma nota CR$1.000 (mil cruzeiros), amarelinha, a que chamavam Cabral, pela efígie de Pedro Álvares Cabral, nela inserta. O velho João queria briga. A turma deixa disso, em redor dele apelava para calma. “Seu” João estufava o peito, retorcia a nota de mil entre dedos e deblaterava: Vem pegar o dinheiro, vem! Eu também implorei, mas ele me deu um safanão e retornei ao meu banco. Aconteceu que de tanto apertar os mil cruzeiros, a nota despedaçou-se. Assim, por causa de cinco cruzeiros, perdeu-se mil cruzeiros. A viagem, depois de horas e do clamor de passageiros, recomeçou. Não sei quem venceu a querela, se o chefe do trem ou se “seu” João.
Encerrando, descemos em Valadares, “seu” João apadrinhou, no casamento, os noivos. Informo que houve um jantar para os principais convidados, a comida acabou com a primeira turma que tomou assentos. Eu fiquei com fome dos diabos. Arranjaram-me uma rosca para eu roer. Às onze da noite, um senhor chamado Vadinho ou Vaguinho, despediu-se e voltou para sua casa, no arraial de Valadares. Minha mãe pediu para que ele me levasse.
Na casa de Vaguinho, ou Vadinho, que até hoje lá está, em Valadares, fizeram um quebra-torto (arroz com feijão pagão e ovo) para mim e, no dia seguinte, fui para casa de meu avô, a Fazenda São Mateus, entre Valadares e Rosário de Minas. E na casa de meu avô estava minha vó, uma humilde pessoa, uma santa: Está na Mansão dos bem-aventurados.
Esta quizília (a do trem) deu enorme prejuízo a “seu” João, que se revelou um estraga prazeres. “Seu” João encarnava em espírito e ação o moto: Dou um boi pra não entrar na briga, e uma boiada pra não sair dela, E Quem não pode com a mandinga, não carrega patuá.
Porém, há sempre, um porém: Uma montanha pode encontrar outra maior: “Seu” João havia comprado um botequim, em Francisco Bernardino, bairro de Juiz de Fora, e ganhava algum dinheiro: só para ele. Não levava um pão para casa. Sem a máscara de homem de bem, vivia às custas da mulher, que lavava roupas para fora e, das duas filhas que doavam seus módicos salários para alimentação de todos e pagamento do aluguel. Moravam, então, no local chamado de Banca de areia, em Bernardino. “Seu” João, parasita se tornara. Um dia, entrou em discussão com um PM, cabo da Polícia Militar, de Minas, sobre a invasão de umas galinhas, dele, cabo, no quintal de “seu” João. Cá pra nós: Você acredita que eram galinhas? ou seriam rabos de saia? Eis que o PM sacou do revólver .45 e gritou: “Você quer morrer?!” E descarregou a arma em “seu” João: cinco tiros à queima-roupa; dez furos no corpo. “Seu” João não morreu... Incrível, ainda deu muito trabalho à família.
“Seu” João... um fauno, ferrabrás...
Obs: Sobre a sigla MJ: Inicialmente, o trem ia somente até Penido e, posteriormente, resolveu-se ampliar a linha férrea até Lima Duarte, mas isso foi feito em duas etapas: Primeiro até Manejo (MJ), onde passou a ser estação final por algum tempo e, em seguida, até Lima Duarte. Esse é o motivo do trem passar a ser chamado de MJ (Manejo), por um determinado tempo, pois a localidade foi a estação final até a conclusão do último trecho.
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